A Transição de Internamento Involuntário para Voluntário e o Risco de Descompensação Psiquiátrica: Um Estudo de Coorte Retrospetivo
DOI:
https://doi.org/10.20344/amp.23398Palavras-chave:
Cooperação do Doente, Doentes Internados, Factores de Risco, Hospitalização, Perturbações Mentais, Portugal, Psiquiatria, Readmissão, Tratamento InvoluntárioResumo
Introdução: O internamento involuntário de um doente com doença mental é definido como a admissão numa unidade de internamento sem o seu consentimento. A literatura sugere que o internamento involuntário está associado a baixos níveis de satisfação com o tratamento, ao evitamento dos cuidados de saúde mental e um risco aumentado de reinternamentos involuntários urgentes. Apesar de ser um tratamento que pode salvar vidas, o internamento involuntário também pode ser estigmatizante, prejudicar a relação terapêutica a longo prazo e reduzir a adesão ao tratamento. Nesse sentido, há pouca investigação científica sobre o impacto da mudança de internamento involuntário para voluntário na saúde do doente, como a descompensação psiquiátrica e utilização de cuidados de saúde. O principal objetivo deste estudo foi identificar e avaliar a frequência de readmissões, a um ano, de doentes que transitaram para tratamento voluntário, em comparação com aqueles que permaneceram em tratamento involuntário.
Métodos: Foi realizado um estudo observacional retrospectivo utilizando dados clínicos dos doentes internados involuntariamente em Psiquiatria na Unidade Local de Saúde São João. Todos os internamentos involuntários decorridos entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2022 foram categorizados em dois grupos: doentes inicialmente admitidos involuntariamente, posteriormente convertidos em internamento voluntário e doentes que permaneceram em internamento involuntário até à data de alta. Os dados registados nos processos clínicos no período de um ano após o internamento inicial foram recolhidos e analisados (tanto dados estruturados como entradas de texto livre). Foram realizadas análises descritivas e comparativas.
Resultados: No total, foram incluídos 120 doentes. Um maior número de doentes passou para internamento voluntário (60,8%) comparativamente ao número de doentes que permaneceu em internamento involuntário (39,2%). Comparativamente aos doentes em internamento voluntário, os doentes que permaneceram em internamento involuntário apresentaram um número de reinternamentos ao fim de um ano significativamente superior (36,2% vs 15,3%, p = 0,009) e apresentaram maior número de reinternamentos involuntários (88,2% vs 45,5%, p = 0,030).
Conclusão: O internamento involuntário mostrou estar associado a piores resultados a um ano, sublinhando que a sua utilização deve ser proporcional ao risco apresentado e sujeita a reavaliação regular. A transição para internamento voluntário é uma abordagem razoável, respeita a autonomia do paciente e, desde que seja assegurado o tratamento adequado, não agrava descompensação psiquiátrica.
Downloads
Referências
Aguirre L, Padovano M, Scopetti M, La Russa R, Manetti F, D’Errico S, et al. Mental health law: a comparison of compulsory hospital admission in Italy and the UK. Front Public Health. 2023;11:1265046. DOI: https://doi.org/10.3389/fpubh.2023.1265046
Hustoft K, Larsen TK, Brønnick K, Joa I, Johannessen JO, Ruud T. Voluntary or involuntary acute psychiatric hospitalization in Norway: a 24h follow up study. Int J Law Psychiatry. 2018;56:27-34. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijlp.2017.10.011
Portugal. Lei n.° 35/2023. Diário da República, I Série, n.° 141 (2023/07/24). p.2-23.
Gültekin BK, Çelik S, Tihan A, Beşkardeş AF, Sezer U. Sociodemographic and clinical characteristics of psychiatric inpatients hospitalized involuntarily and voluntarily in a mental health hospital. Noro Psikiyatr Ars. 2013;50:216-21.
Lachner C, Maniaci MJ, Vadeboncoeur TF, Dawson NL, Rummans TA, Roy A, et al. Are pre-existing psychiatric disorders the only reason for involuntary holds in the emergency department? Int J Emerg Med. 2020;13:4. DOI: https://doi.org/10.1186/s12245-020-0265-4
Hofmann AB, Schmid HM, Hofmann LA, Noboa V, Seifritz E, Vetter S, et al. Impact of compulsory admission on treatment and outcome: a propensity score matched analysis. Eur Psychiatry. 2022;65:e6. DOI: https://doi.org/10.1192/j.eurpsy.2022.4
Lin CE, Chung CH, Chen LF, Chen PC, Cheng HY, Chien WC. Compulsory admission is associated with an increased risk of readmission in patients with schizophrenia: a 7-year, population-based, retrospective cohort study. Soc Psychiatry Epidemiol. 2019;54:243-53. DOI: https://doi.org/10.1007/s00127-018-1606-y
Draghetti S, Alberti S, Borgiani G, Panariello F, De Ronchi D, Atti AR. Compulsory and voluntary admissions in comparison: a 9-year long observational study. Int J Soc Psychiatry. 2022;68:1716-6. DOI: https://doi.org/10.1177/00207640211057731
Kallert TW, Glöckner M, Schützwohl M. Involuntary vs. voluntary hospital admission. a systematic literature review on outcome diversity. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci. 2008;258:195-209. DOI: https://doi.org/10.1007/s00406-007-0777-4
Drakonakis N, Stylianidis S, Peppou LE, Douzenis A, Nikolaidi S, Tzavara C, et al. Outcome of voluntary vs involuntary admissions in greece over 2 years after discharge: a cohort study in the psychiatric hospital of Attica “Dafni”. Community Ment Health J. 2022;58:633-44. DOI: https://doi.org/10.1007/s10597-021-00865-y
Shiina A, Sato A, Iyo M, Fujii C. Outcomes of administrative involuntary hospitalization: a national retrospective cohort study in Japan. World J Psychiatry. 2019;9:99-106. DOI: https://doi.org/10.5498/wjp.v9.i7.99
Benchimol EI, Smeeth L, Guttmann A, Harron K, Moher D, Petersen I, et al. The REporting of studies Conducted using Observational Routinely-collected health Data (RECORD) statement. PLoS Medicine. 2015;12:e1001885. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1001885
World Health Organization. International statistical classification of diseases and related health problems. 10th revision. Geneva: WHO; 2019.
Hung YY, Chan HY, Pan YJ. Risk factors for readmission in schizophrenia patients following involuntary admission. PLoS One. 2017;12:e0186768. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0186768
Silva M, Antunes A, Azeredo-Lopes S, Loureiro A, Saraceno B, Caldasde- Almeida JM, et al. Factors associated with involuntary psychiatric hospitalization in Portugal. Int J Ment Health Syst. 2021;15:37. DOI: https://doi.org/10.1186/s13033-021-00460-4
Ziltener T, Möller J, Imfeld L, Lieb R, Lang UE, Huber CG. Time to readmission in psychiatric inpatients with a therapeutic leave. J Psychiatr Res. 2021;144:102-9. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2021.09.050
Aluh DO, Santos-Dias M, Silva M, Pedrosa B, Grigaitė U, Silva RC, et al. Contextual factors influencing the use of coercive measures in Portuguese mental health care. Int J Law Psychiatry. 2023;90:101918. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijlp.2023.101918
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Secção
Licença
Direitos de Autor (c) 2025 Acta Médica Portuguesa

Este trabalho encontra-se publicado com a Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0.
Todos os artigos publicados na AMP são de acesso aberto e cumprem os requisitos das agências de financiamento ou instituições académicas. Relativamente à utilização por terceiros a AMP rege-se pelos termos da licença Creative Commons ‘Atribuição – Uso Não-Comercial – (CC-BY-NC)’.
É da responsabilidade do autor obter permissão para reproduzir figuras, tabelas, etc., de outras publicações. Após a aceitação de um artigo, os autores serão convidados a preencher uma “Declaração de Responsabilidade Autoral e Partilha de Direitos de Autor “(http://www.actamedicaportuguesa.com/info/AMP-NormasPublicacao.pdf) e a “Declaração de Potenciais Conflitos de Interesse” (http://www.icmje.org/conflicts-of-interest) do ICMJE. Será enviado um e-mail ao autor correspondente, confirmando a receção do manuscrito.
Após a publicação, os autores ficam autorizados a disponibilizar os seus artigos em repositórios das suas instituições de origem, desde que mencionem sempre onde foram publicados e de acordo com a licença Creative Commons

