A Transição de Internamento Involuntário para Voluntário e o Risco de Descompensação Psiquiátrica: Um Estudo de Coorte Retrospetivo

Autores

  • Margarida Castro Faculdade de Medicina. Universidade do Porto. Porto. Portugal. https://orcid.org/0009-0001-5838-6423
  • Joana Tavares Coelho Psychiatry Service. Unidade Local de Saúde São João. Porto. Portugal; Department of Clinical Neurosciences and Mental Health. Faculdade de Medicina. Universidade do Porto. Porto. Portugal. https://orcid.org/0000-0003-2647-600X
  • Ana Rita Ferreira Department of Clinical Neurosciences and Mental Health. Faculdade de Medicina. Universidade do Porto. Porto. Portugal; RISE-Health. Faculdade de Medicina. Universidade do Porto. Porto. Portugal. https://orcid.org/0000-0002-0178-8376
  • Henrique Salgado Psychiatry Service. Unidade Local de Saúde São João. Porto. Portugal; Department of Clinical Neurosciences and Mental Health. Faculdade de Medicina. Universidade do Porto. Porto. Portugal. https://orcid.org/0009-0000-7707-4233

DOI:

https://doi.org/10.20344/amp.23398

Palavras-chave:

Cooperação do Doente, Doentes Internados, Factores de Risco, Hospitalização, Perturbações Mentais, Portugal, Psiquiatria, Readmissão, Tratamento Involuntário

Resumo

Introdução: O internamento involuntário de um doente com doença mental é definido como a admissão numa unidade de internamento sem o seu consentimento. A literatura sugere que o internamento involuntário está associado a baixos níveis de satisfação com o tratamento, ao evitamento dos cuidados de saúde mental e um risco aumentado de reinternamentos involuntários urgentes. Apesar de ser um tratamento que pode salvar vidas, o internamento involuntário também pode ser estigmatizante, prejudicar a relação terapêutica a longo prazo e reduzir a adesão ao tratamento. Nesse sentido, há pouca investigação científica sobre o impacto da mudança de internamento involuntário para voluntário na saúde do doente, como a descompensação psiquiátrica e utilização de cuidados de saúde. O principal objetivo deste estudo foi identificar e avaliar a frequência de readmissões, a um ano, de doentes que transitaram para tratamento voluntário, em comparação com aqueles que permaneceram em tratamento involuntário.
Métodos: Foi realizado um estudo observacional retrospectivo utilizando dados clínicos dos doentes internados involuntariamente em Psiquiatria na Unidade Local de Saúde São João. Todos os internamentos involuntários decorridos entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2022 foram categorizados em dois grupos: doentes inicialmente admitidos involuntariamente, posteriormente convertidos em internamento voluntário e doentes que permaneceram em internamento involuntário até à data de alta. Os dados registados nos processos clínicos no período de um ano após o internamento inicial foram recolhidos e analisados (tanto dados estruturados como entradas de texto livre). Foram realizadas análises descritivas e comparativas.
Resultados: No total, foram incluídos 120 doentes. Um maior número de doentes passou para internamento voluntário (60,8%) comparativamente ao número de doentes que permaneceu em internamento involuntário (39,2%). Comparativamente aos doentes em internamento voluntário, os doentes que permaneceram em internamento involuntário apresentaram um número de reinternamentos ao fim de um ano significativamente superior (36,2% vs 15,3%, p = 0,009) e apresentaram maior número de reinternamentos involuntários (88,2% vs 45,5%, p = 0,030).
Conclusão: O internamento involuntário mostrou estar associado a piores resultados a um ano, sublinhando que a sua utilização deve ser proporcional ao risco apresentado e sujeita a reavaliação regular. A transição para internamento voluntário é uma abordagem razoável, respeita a autonomia do paciente e, desde que seja assegurado o tratamento adequado, não agrava descompensação psiquiátrica.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

Aguirre L, Padovano M, Scopetti M, La Russa R, Manetti F, D’Errico S, et al. Mental health law: a comparison of compulsory hospital admission in Italy and the UK. Front Public Health. 2023;11:1265046. DOI: https://doi.org/10.3389/fpubh.2023.1265046

Hustoft K, Larsen TK, Brønnick K, Joa I, Johannessen JO, Ruud T. Voluntary or involuntary acute psychiatric hospitalization in Norway: a 24h follow up study. Int J Law Psychiatry. 2018;56:27-34. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijlp.2017.10.011

Portugal. Lei n.° 35/2023. Diário da República, I Série, n.° 141 (2023/07/24). p.2-23.

Gültekin BK, Çelik S, Tihan A, Beşkardeş AF, Sezer U. Sociodemographic and clinical characteristics of psychiatric inpatients hospitalized involuntarily and voluntarily in a mental health hospital. Noro Psikiyatr Ars. 2013;50:216-21.

Lachner C, Maniaci MJ, Vadeboncoeur TF, Dawson NL, Rummans TA, Roy A, et al. Are pre-existing psychiatric disorders the only reason for involuntary holds in the emergency department? Int J Emerg Med. 2020;13:4. DOI: https://doi.org/10.1186/s12245-020-0265-4

Hofmann AB, Schmid HM, Hofmann LA, Noboa V, Seifritz E, Vetter S, et al. Impact of compulsory admission on treatment and outcome: a propensity score matched analysis. Eur Psychiatry. 2022;65:e6. DOI: https://doi.org/10.1192/j.eurpsy.2022.4

Lin CE, Chung CH, Chen LF, Chen PC, Cheng HY, Chien WC. Compulsory admission is associated with an increased risk of readmission in patients with schizophrenia: a 7-year, population-based, retrospective cohort study. Soc Psychiatry Epidemiol. 2019;54:243-53. DOI: https://doi.org/10.1007/s00127-018-1606-y

Draghetti S, Alberti S, Borgiani G, Panariello F, De Ronchi D, Atti AR. Compulsory and voluntary admissions in comparison: a 9-year long observational study. Int J Soc Psychiatry. 2022;68:1716-6. DOI: https://doi.org/10.1177/00207640211057731

Kallert TW, Glöckner M, Schützwohl M. Involuntary vs. voluntary hospital admission. a systematic literature review on outcome diversity. Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci. 2008;258:195-209. DOI: https://doi.org/10.1007/s00406-007-0777-4

Drakonakis N, Stylianidis S, Peppou LE, Douzenis A, Nikolaidi S, Tzavara C, et al. Outcome of voluntary vs involuntary admissions in greece over 2 years after discharge: a cohort study in the psychiatric hospital of Attica “Dafni”. Community Ment Health J. 2022;58:633-44. DOI: https://doi.org/10.1007/s10597-021-00865-y

Shiina A, Sato A, Iyo M, Fujii C. Outcomes of administrative involuntary hospitalization: a national retrospective cohort study in Japan. World J Psychiatry. 2019;9:99-106. DOI: https://doi.org/10.5498/wjp.v9.i7.99

Benchimol EI, Smeeth L, Guttmann A, Harron K, Moher D, Petersen I, et al. The REporting of studies Conducted using Observational Routinely-collected health Data (RECORD) statement. PLoS Medicine. 2015;12:e1001885. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1001885

World Health Organization. International statistical classification of diseases and related health problems. 10th revision. Geneva: WHO; 2019.

Hung YY, Chan HY, Pan YJ. Risk factors for readmission in schizophrenia patients following involuntary admission. PLoS One. 2017;12:e0186768. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0186768

Silva M, Antunes A, Azeredo-Lopes S, Loureiro A, Saraceno B, Caldasde- Almeida JM, et al. Factors associated with involuntary psychiatric hospitalization in Portugal. Int J Ment Health Syst. 2021;15:37. DOI: https://doi.org/10.1186/s13033-021-00460-4

Ziltener T, Möller J, Imfeld L, Lieb R, Lang UE, Huber CG. Time to readmission in psychiatric inpatients with a therapeutic leave. J Psychiatr Res. 2021;144:102-9. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jpsychires.2021.09.050

Aluh DO, Santos-Dias M, Silva M, Pedrosa B, Grigaitė U, Silva RC, et al. Contextual factors influencing the use of coercive measures in Portuguese mental health care. Int J Law Psychiatry. 2023;90:101918. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijlp.2023.101918

Downloads

Publicado

2025-12-02

Como Citar

1.
Castro M, Tavares Coelho J, Ferreira AR, Salgado H. A Transição de Internamento Involuntário para Voluntário e o Risco de Descompensação Psiquiátrica: Um Estudo de Coorte Retrospetivo. Acta Med Port [Internet]. 2 de Dezembro de 2025 [citado 5 de Dezembro de 2025];38(12):785-94. Disponível em: https://actamedicaportuguesa.com/revista/index.php/amp/article/view/23398

Edição

Secção

Original